O Equador amazônico, desde sempre e para sempre

Traducido al portugués por Leo Gonçalves (1975), poeta y traductor, nacido en Belo Horizonte. Autor de "Tempo tambor" (2024), "Use o assento para flutuar" (2018) y "das infimidades" (2004).

Tradujo autores diversos donde entre ellos los poetas Juan Gelman, Langston Hughes, William Blake, Paul Valéry y Aimé Césaire. Se presentó en algunas antologías importantes brasileñas e internacionales. Escribe en el www.salamalandro.redezero.org

O Equador amazônico, desde sempre e para sempre

Publicado em video em: https://fb.watch/qgObSkAQia/ desde 1h12' hasta 1h25'

por Jorge Mora Varela

Foi a última proclamação do presidente da república do Equador, Jaime Roldós Aguilera, em 24 de maio de 1981, algumas horas antes de morrer no Cenepa, território de conflito entre o Equador e o Peru há dois séculos.

O presidente Roldós falava de mitos ou verdade históricas?

Jorge Brasil 

Para falar da história e de seus protagonistas, primeiro quero reivindicar uma revisão dos termos com os quais tratos os exploradores, nesse caso do eldorado, do país da canela e do Amazonas.

Costuma-se dizer superficialmente e sem muito raciocínio que chegaram a estas terras que constituem o novo mundo, a América, “o pior do país mais atrasado da Europa”.

E NÃO, não sou filho de migrantes nem do lado paterno nem materno; venho das mulheres mouras que saíram da Espanha, e dos empreendedores do doce que chegaram da Nápolis espanhola e eles migraram para encontrar outras formas de vida e o fizeram de forma admirável, com caráter, decisão, coragem e esperança.

Assim como eu, também decidi migrar em companhia da minha família, do pequeno povoado para a cidade grande e não o fizemos por termos sido parte do pior que já cuspiu o povo, só havíamos buscado construir um outro cenário outras formas de vida, e assim como meus antepassados, o fizemos com caráter, decisão, coragem e esperança.

Por esta razão, quero pensar nesse caso em meu país, o Equador, o eldorado, o país da canela e no Amazonas, do ponto de vista do caráter, da decisão, da coragem e da esperança.

E que sorte viver no tempo da globalidade, onde podemos ter o conhecimento do mundo na palma da mão, com duas ferramentas que a mim em particular ainda causam assombro, a internet e os dispositivos inteligentes.

Caso contrário, continuaríamos fechados no país e no mudno das fronteiras curtas, cercados pela “verdade oficial”, o livro de texto ou os mitos e lendas que eram transmitidos de boca em boca e de complexo em complexo.

Condenados à memória eufórica, com o dever cívico de recordar o passado melhor do que foi, ou pior, do que nunca aconteceu à memória fatalista, que nos leva a viver com medo e culpar daquilo ao qual creio que ocorreu porque assim me contaram, e então a falsificar a história para sustentar as barreiras, as fronteiras, os ódios e o rechaço ao outro.

Como não pensar e admirar que um fato inesperado, fortuito, como a chegada de Colombo, e de suas caravelas ao Caribe em 1492 e em um lapso de 50 anos chegaram ao Amazonas a partir dos Andes em Quito.

Me parece assombroso como conseguiram isso, a mim, em particular, um ser humano da pós-modernidade, me causa estupor o agreste da geografia vista de um avião, o abissal e o imenso do oceano, o escabroso e intricado sistema montanhoso e a imensidade da selva e um grupo de homens decididos conseguiram: mover-se, sobreviver e impor sua cultura e sua religião em um imenso território desconhecido, diferente e difícil, e o fizeram com caráter, decisão, coragem e esperança, descobrir e chegar a um sem-número de lugares do que seria a América.

É inevitável partir do mesmo fato histórico, em 1492, Cristóvão Colombo se deparou com as Antilhas, quando se supõe que ia a Capai e Sipango em busca das especiarias, em 1493 fundam a Hispaniola, em 1495 descobriram para a Europa o que seria Trinidad, Venezuela e Panamá, em 1499, todos podem explorar viagens menores do Brasil ao Panamá.

Em 1511 chegaram a Cuba, em 1512, dão-se o tempo para discutir e aprovar as leis de Burgos para regular e racionalizar o trato dos índios, em 1519, Cortés e um punhado de castelhanos conquistam os império dos Aztecas, em 1521, Magalhães e El Cano dão a volta ao mundo, em 1524, Pizarro e os treze da fama chegam até o Peru, em 1528, exploram o que hoje é USA e a Califórnia, em 1531 exploram a foz do rio Orinoco, em 1534 chegam ao reino de Quito, em 1535 a Lima, em 1537 se dá a guerra de interesses particulares entre Almagro e Pizarro, em 1538 é fundada Santa Fé de Bogotá, em 1539 é criada a primeira universidade da América, em 1541, Francisco de Orellana chega ao Amazonas pelo lado do ocidentente, dos Andes. 

Nessas terras, onde as quatro civilizações mais significativas foram os Astecas, os Maias, ou o que restava deles, Incas no que hoje é o Peru e os Muisca na atual Colombia, e um sem número de povos dispersos nas terras costeiras, montanhosas e selvagens, ante a frustração de não ter chegado à Índia, à China ou ao Japão das especiarias e de Marco Polo.

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Então, onde estavam? E se não era o lugar de destino, que fazer?, como recuperar o investimento, nesse momento se abria espaço para a inquietude que raiava na obsessão dos casatelhanos, haviam encontrado vestígios de ouro e pedras preciosas e se encheu seu imaginário com lendas como a do El Dorado, e os nativos, para tirá-los de cima, afirmavam que os recursos que obcecavam os estranhos barbados e vestidos de lata, sempre estavam para lém, até que os indícios indicavam que a leste de Quito o ouro era recolhido com a mão e também era a terra da canela.

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Há que se recordar que, em 1500 entre a terceira e quarta viagem de Colombo, o marinheiro Vicente Yañez Pinzón, chegou ao que logo se conheceria como a foz do Amazonas e ao que chamaram de Mar Dulce ou o Rio Grande, que era tão caudaloso e imponente de água doce tão grande e imponente que alcançava 40 léguas mar adentro em meio a uma pororoca.

Para nossa história, os Pizarro procuravam ouro, Gonzalo Pizarro nascido em Trujillo em 1502 e em seu momento em 1540, governador de Quito, conhecia dos supostos tesouros e da canela que se encontrariam a leste de seu governo e organizou as respectivas expedições rumo ao oriente geográfico dos territórios desconhecidos.

Em fevereiro de 1541 partiu para sua aventura com 220 espanhóis, 200 cavalos, 5000 nativos portuários e cães de caça, em companhia de alguns exploradores castelhanos que haviam iniciado a busca do país da canela.

Francisco de Orellana, primo dos Pizarro e trujillano, era, por sua vez, fundador e governador do porto de Guayaquil, um mês depois de Pizarro, em março de 1541 com 23 homens iniciou a viagem a leste até alcançar Pizarro nas proximidades do vulcão Sumaco a uns 150 km de Quito.

Tudo isso sabemos pelas crônicas do Fray Gaspar de Carvajal que acompanhava a expedição.

Real Audiencia de Quito

Parar na beira da cidade de Quito e olhar o caminho por onde os castelhanos se aventuraram rumo ao oriente é surpreendente e ir a uma expedição tão numerosa parece um ato inconsciente e descabelado. Claro, ninguém podia imaginar a imensidão e a dificuldade da selva amazônica, a maior reserva de água doce do mundo, nem tampouco o tamanho descomunal do continente.

Devido ao grau de dificuldade da empresa, era inevitável que os nativos portadores fugiam ou morriam e era difícil avançar.

Cada vez aparecia rios enormes, então em novembro desse mesmo ano e no meio da selva construíram um pequeno brigue precário, o São Pedro, para avançar o Rio Napo, buscar alimentos e regressar, Orellana com um grupo de sessenta castelhanos encarregados da missão navegou por 43 dias e já não posso voltar.

Gonzalo Pizarro deve ter voltado a Quito em condições difíceis e desastrosas e chegou em junho de 1542 descalços, famélicos e feridos.

Enquanto isso, Orellana foi arrastrado pelas águas por mais de oito meses, absortos escutavam tambores, navegavam entre povoadores amistosos e com eles podia acessar os alimentos, mas com frequência se moviam entre povoadores hostis.

Era uma travessia interminável, intuíam que em algum momento esse imenso rio desembocaria no Atlântico sem ideia de longitude.

límites Ecuador Parú.01

No que logo se entenderia que estavam pela metade do percurso entre os rios Negro e Tapajós, ouviram falar da chefe guerreira Coñorí, e foi inevitável relacioná-la com a história mítica de Artemísia das tribos guerreiras do Cáucaso dos ingushes e os chechênios nas terras atuais da Turquia, Geórgia, Armênia e Azerbajão onde se contavadas guerreiras ingushitas e chechênias, as Amazonas, guerreiras formosas e fortes que viviam no porto de Ponto na Turquia das quais se dizia que se cortavam um peito direito para manejar melhor o arco.

Aos exaustos navegantes exploradores lhes parecia que foram atacados por belíssimas mulheres guerreiras, que lutavam nuas, mas ao que parece foram nativos hostis que tinham cabelo comprido.

Não o saberemos nunca se esta história tem fundos de realidade, mas ficou o nome Amazonas para este rio descomunal.

Até que chegaram à foz no Atlântico a 26 de agosto de 1542 após navegar por mais de 6000 km.

Ao chegar aos assentamentos castelhanos, Orellana deve ter afrontado a demanda de Gonzalo Pizarro como traidor, teve a oportunidade de limpar seu nome, se casar com a sevilhana Ana de Ayala e ao voltar para o Amazonas (“Nova Andaluzia”), pela desembocadura no Atlântico com 300 homens e alguns religiosos, instalar dois povos um na entrada do rio e outro no melhor lugar, em 1544, onde morreu de febre nos braços de sua esposa.

No século XVI (os 1500) a conquista da América se centrou em tantas frentes de interesse estratégico, de recursos, políticos, religiosos e durante um século o Amazonas e suas terras pareciam não importar a ninguém.

Um século depois em uma expedição que aconteceria entre 1637 e 1639, o governador dos territórios do Grão-Pará, situado no delta do Amazonas, o governador, Jácome Raimundo de Noronha escolheu o Capitão Pablo Teixeira, para que com 47 canoas e 70 soldados e 1200 nativos flechadores e remadores fosse da desembocadura de Belém do Pará, para atravessar o Amazonas e possa chegar até Quito.

A vê-lo chegar a Teixeira vindo do oriente, o governador de Quito temia que os portugueses tivessem encontrado uma via para chegar da costa Atlântica até o vice-reinado do Peru e a Real Audiência de Quito, com isso pereceriam seus prezados recursos minerais, o ouro e a prata.

Com todo o tino, devolveram-no a Teixeira e seus acompanhantes aos territórios portugueses para afastá-lo de Quito e de Lima, o fez em 1639, a caminho do Amazonas, na confluência dos rios Aguarico e Napo (atual província dos Sucumbíos – Equador, antes do que hoje é o Yasuní) Teixeira estabeleceu o limite das fronteiras espanholas e portuguesas e a partir daquele momento, o Amazonas pertence aos portugueses, do Brasil, amparado no Tratado de Tordesilhas de 1494, assinado entre Isabel e Fernando, reis de Castela e Aragón, o rei João II de Portugual.

A partir da instauração da Grande Golômbia, em 1819, ainda NÃO havia nascido o Equador, como parte dos territórios grã-colombinos nos enrascamos com o vice-reinado do Peru e logo entre o Equador e o Peru, como países independentes, não litigamos por dois séculos no direito à soberania dos territórios orientais que davam ao Amazonas. E interpretamos cada qual a sua maneira o Uti Possidetis, o princípio do direito internacional sobre soberania territorial “como possuías” a expressão indica a manutenção da soberania sobre um território, se este já foi definido no passado.

1743

Nós equatorianos nascemos, crescemos e sonhamos com o Oriente Equatoriano que chegava ao Amazonas, com os territórios de Tumbes Jaén e Maynas como nossos.

Em 1910, o General Eloy Alfaro reclamava para nós:  Tumbes Marañón ou a guerra.

Logo a guerra de 41 e a “perda do Oriente equatoriano” com a assinatura do protocolo do Rio de Janeiro e a reclamação de nulidade do mesmo por parte do governo do Equador.

Os peruanos também nasceram, cresceram e sonharam com o horizonte amazônico, com Guayaquil e com seus territórios que chegavam até a fronteira sobre a Antisana, em teoria, a fronteira peruana eu poderia ver de minha própria casa.

Cedido al Ecuador

E entre cédulas reais ou imaginárias, entre guerras, conatos, ameaças, acordos, desconhecimentos, negações, passamos dos séculos, 180 anos de conflito com os peruanos.

Entre desacordos de fronteiras que iam e vinham com reis que administravam por olhos e interesses distantes e diversos, onde fatos tão simples como os protestos pela alta do preço do pão na Espanha e a acusação com a conseguinte expulsão dos jesuítas da Espanha peninsular, e a americana, incidiram a esta incerteza com a conseguinte insegurança jurídica de saber onde e a quem pertenciam as terras do novo continente.

Ao menos os equatorianos salvamos Quijos e Canelos, as atuais províncias de Sucumbíos e Nova Loja e que dói aos peruanos.

Ecuador amazónico

Até que a 26 de outubro de 1998, em Brasília, os presidentes da república Jamil Mahuad do Equador e Alberto Fujimori do Peru, assinaram o tratado de paz, como consolo para bobos, aceitamos a ridícula presença do Equador a 1 km quadrado em Tiwinza no interior do Peru e a possibilidade de navegar com liberdade e soberania por territórios peruanos que nos conectariam com o Amazonas desde dois portos nas localidades de Saramiriza e Pijuayal.

Saramiriza existe e o Equador poderia utilizá-lo como porto fluvial que o levasse até o Amazonas brasileiro e o Pijuayal nem se quera existe.

Então, as proclamações do general Eloy Alfaro onde reclamava para nós: Tumbes Marañon ou a guerra. Ou a proclamação do presidente da república do Equador Jaime Roldós Aguilera a 24 de maio de 1981, uma horas antes de morrer no Cenepa “O Equador amazônico, desde sempre e para sempre”. “Viva a pátria”, só pertencem aos mitos sobre os quais o povo equatoriano construiu sua identidade nacional.

E isso é o Equador, um país que fundamentou seu passado em razão de algo que nunca ocorreu e que viveu seus primeiros dois séculos de vida republicana com a ideia de odiar o peruano pelo “que nos roubaram” porque assim nos contaram.

Entretanto, a pós-modernidade e a tecnologia comunicacional, nos permitirá retirar o lixo histórico e construir os mitos com os quais deveremos viver e deverão fazê-lo as novas gerações que falem de potencialidades, de recursos e de tesouros reais, sãos e que livrem do engano histórico daninho ao qual estivemos atados.

Por isso quero expressar meu agradecimento às feiras virtuais do livro em todo o mundo criadas e auspiciadas pela CONFEDERAÇÃO INTERNACIONAL DO LIVRO nacida no Peru, das mãos de Cesar Salvatierra e Alan Morales e da embaixadora cultural Cristina Labat e ao Portal www.tulcanonline.com porque são as vias maravilhosas que tenho para reescrever a história.

 

Jorge Mora Varela

 

Fontes:

Memorias de un tambor. Orellana. La epopeya del Amazonas,

Diana Uribe, Historia de Brasil - Cap. 12 Brasil amazónico,

Límites entre Ecuador y Perú. La Historia Completa, de Hugox Chugox,

Jaime Roldós